"A alma humana é crística por sua natureza". Tertuliano

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Deus e eu


Uma das maiores questões humanas, para muitos a maior, é a sobre a relação com Deus. Ou se ele existe ou deixa de existir. É impossível um ser consciente de si passar pela vida sem fazer questões que remetam a Deus: Quem sou eu? De onde venho? Para que serve a vida? Quem criou o universo? O que é a natureza? Mesmo que indiretamente todas estas questões nos remetem a um princípio criador ou a um princípio que explicaria os desdobramentos da vida. Questões que nos levam a Deus. Ou ainda podemos nos questionar diretamente: Quem é Deus? Deus existe? Se existe quem O criou? Como é Deus? Deus, Universo, Natureza, o Absoluto, qual seu verdadeiro nome e sua essência? Etc.
Qualquer resposta que se dê a qualquer uma destas questões ficará insuficiente. Impossível responder satisfatoriamente, impossível ficar sem se perguntar.
A maneira como nos relacionamos com tais questões podem definir nossa vida e a forma como a encaramos.

Tive uma educação religiosa católica. Meu pai foi um fervoroso católico que na sua idade mais jovem dava aulas de catecismo, fazia novenas, fez parte de congregação dos devotos de Maria, foi ministro do batismo etc. Minha mãe também muito fervorosa. Apesar de pouco participativa de reuniões na igreja e nas suas missas ainda assim poderia se dizer que ela é uma católica praticante. Ainda hoje reza seus terços. Minha educação religiosa foi rigorosa, tradicional e rígida. Lembro-me ainda do livro de catecismo de mais de uma centena de perguntas com respostas prontas e definitivas. Decorei-as todas. Não me lembro de mais nenhuma. Ainda bem.
Deus para mim era o super-todo-poderoso onisciente, onipresente e onipotente que via tudo e punia tudo. Quando criança eu tinha medo de Deus. Eu também, por conta das lições familiares e do catecismo, sentia muita culpa. Existia um Deus repressor e punitivo que vingaria cada pecado. Ao mesmo tempo era um Deus que não satisfazia em nada as questões que eu me colocava e que não eram permitidas de serem expostas. Se pelo menos minhas questões fossem, mesmo que parcialmente, respondidas suportar tal Deus seria menos doloroso.
Com o tempo me afastei do Deus do medo e da culpa. À medida que crescemos novas referências e novos questionamentos se somam ou excluem referências rígidas de uma infância limitada. No entanto novas perguntas surgiam e se acumulavam a outras mais antigas.
Apesar do distanciamento do antigo Deus antigas feridas ficaram abertas.
Eu não agüentei sustentar mais um Deus que não respondia minhas perguntas mais básicas, nem por isso mais essenciais, e ao mesmo tempo me trazia à lembrança um tempo de medo, angústia e muitas culpas. Aquele Deus eu precisava deixá-lo.
A universidade foi a pá de cal. Aquele Deus não resistiu à análise crítica e à História. O relacionamento amoroso sério com uma colega de classe da faculdade, cuja família era de intelectuais e ateus, ajudou a finalizar de vez minha relação com aquele Deus da infância.
Passei a negá-Lo.

A negação pode ser apenas uma forma de tentar desacreditar algo que tem importância crucial para alguém. A negação muitas vezes nos aproxima ainda mais do objeto negado. A negação de Deus como uma forma de ateísmo pode ser simplesmente a reafirmação de Deus pela via contrária. Para Freud a negação é um mecanismo de defesa do inconsciente. Se negamos sistematicamente algo é porque, muito provavelmente, o contrário é verdadeiro. Tal situação é conhecida popularmente pelo ditado “quem desdenha quer comprar”. E assim pode ocorrer com inúmeros “ateus”. Assim, pelo menos, ocorria comigo.
Não demorou muito para eu perceber que eu não conseguia sustentar a idéia da inexistência de Deus. Já ouvi (ou li) que um ateu tornar-se crente é bem possível, já um crente tornar-se ateu.... Eu, então, como um ser produzido das entranhas do racionalismo acadêmico achei uma saída bastante oportuna: tornei-me agnóstico. Defendia a idéia, então, que assim como não era possível provar a existência de Deus também era impossível provar sua inexistência. Era uma situação cômoda. Eu estava em cima do muro.
Este período (de negação e agnosticismo) foi o tempo mais difícil da minha vida. Eu passava por sérios problemas emocionais. Foi diagnosticado depressão. Uma coisa estava diretamente relacionada à outra. O meu, pelo menos aparente, distanciamento de Deus, contribuía para uma ausência total de perspectiva de vida. E o meu olhar (pessimista) sobre o mundo me fazia desacreditar em Deus. As velhas e batidas questões não saiam da minha mente: “Como pode existir um Deus que permite a tragédia que é o continente africano?” “Como pode existir Deus com tanta injustiça?” Etc. O buraco era muito fundo e a ajuda parecia distante, senão inexistia. Um provérbio chinês expressava bem o que eu passava: “O céu há de parecer pequeno para quem o olha do fundo do poço”. Eu estava lá e me sentia sozinho.

Continua...

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